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Um mundo para todos: “A rádio permite-me construir imagens mentais do que ouço”

Há uma relação muito estreita entre a rádio e os deficientes visuais. A rádio é um meio democrático, de linguagem particular e com características que o tornam além de informativo, emotivo e imaginativo, permitindo que os ouvintes construam as suas próprias imagens.

Esta terça-feira, 24 de maio, nas instalações do Grupo da Rádio Renascença, na Buraca, o grupo do Centro de Reabilitação de Nossa Senhora dos Anjos (CRNSA), propriedade da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, espera com alguma ansiedade a visita. O coração bate mais depressa, sente-se emoção. Vão sentir onde se faz a magia da rádio.

A receção não poderia ser melhor. Após um breve resumo histórico do Grupo da Renascença, foi feita uma audiodescrição dos corredores, da redação, dos estúdios, das pessoas, como estão vestidas, se são altas ou baixas. O objetivo era descrever da melhor forma possível todos os elementos e pessoas nas instalações.

Os testemunhos

João Fernandes, 21 anos, com cegueira total, destaca-se pelo seu entusiasmo e curiosidade. Está a realizar um sonho de criança. Conhece como ninguém os locutores, as estações de rádio, os programas e tudo o que tenha a ver com este mundo.

Enquanto esperam para entrar, João explica a sua paixão pela rádio e o sonho que tem de conhecer o Pedro Azevedo da Renascença. Para o jovem utente do CRNSA o locutor está ao nível de um Cristiano Ronaldo. Um marca golos que valem milhões, outro faz relatos que são verdadeiras imagens. Um pequeno milagre para quem nada vê.

Nesse instante, João improvisa um relato de um jogo de futebol digno de qualquer emissora.

 

 

“A rádio é um modo de vida para mim. É uma companhia diária que me transporta para o mundo e que, pela descrição pormenorizada, me permite contruir imagens mentais do que ouço”, finaliza.

Carlos Pereira, 55 anos, perdeu a visão quando tinha 20. Foi técnico de som e é locutor numa rádio online. “A rádio é uma grande companhia para quem não vê, algo que a televisão não consegue fazer. A rádio tem uma descrição aprofundada que permite ao deficiente visual (com cegueira ou baixa-visão) construir imagens. O relato de futebol é um bom exemplo. Os detalhes e a descrição pormenorizada do locutor transportam-nos para uma construção de uma imagem do que se está a passar a cada segundo do jogo”, nota. “Gostava de um dia trabalhar numa rádio a sério, numa rádio grande. Esse é um dos meus sonhos”, confessa Carlos.

O sentimento é geral entre os utentes. A rádio é um importante meio de comunicação. Sentem-se valorizados e incluídos, pois podem “ouvir o mundo com palavras”, compreender melhor os mais variados temas e conhecer várias realidades.

 

Teatro para todos. “A audiodescrição ‘permite-me’ ver o mundo”

A iniciativa é fruto de uma parceria entre o Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e o Teatro D. Maria II, no âmbito de um projeto de acessibilidade, que tem como intuito possibilitar o acesso universal ao edifício, à programação e a outras iniciativas desenvolvidas ao longo da temporada. O objetivo é que ninguém deixe de ir ao teatro, seja qual a for a condição que possua.

Foi com natural entusiasmo, curiosidade e alguma ansiedade que Joana, Maria e Carla, utentes do Centro de Reabilitação Nossa Senhora dos Anjos (CRNSA), equipamento da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa – se preparavam para assistir à peça “Ilhas”, no Teatro D. Maria II, este domingo. Uma peça que traduz as imagens em palavras…

As pessoas cegas ou com baixa-visão que vão assistir à peça têm a possibilidade de entrar mais cedo, fazer um reconhecimento prévio do espaço, conhecer os atores e, depois, no espetáculo, com um auricular, ouvir a tradutora que fará a audiodescrição. O objetivo é descrever todos os movimentos, ações e todos os elementos de cenário. Como descrever um sorriso, uma careta, uma cara triste, uma expressão de surpresa ou de irritação, ou um movimento de dança para pessoas com deficiência visual? Este é um dos desafios da audiodescrição. Transformar o teatro numa experiência completa para quem não vê.

Os testemunhos

Joana Ribeiro, 27 anos, de Lisboa, não esconde a sua ansiedade e emoção. É a primeira vez que irá assistir ao teatro com recurso à audiodescrição. No átrio que antecede a sala Garrett, Joana conta que parece um sonho tornado realidade. Com apenas 5% de visão, a jovem utente do CRNSA faz teatro amador na SMUP, na Parede, e está bastante nervosa com o facto de assistir a esta peça de teatro. “Já era tempo da verdadeira inclusão. Nós estamos muito limitados, e esta iniciativa é uma oportunidade na igualdade de direitos”, diz sem rodeios. A sua mãe, Maria Ribeiro, destaca a “oportunidade” da iniciativa e a “diferença” que um espetáculo acessível pode fazer na vida de um cego ou com baixa-visão.

“Quando estou a fazer desporto, esqueço-me que não vejo”

No âmbito das comemorações do primeiro Dia Mundial do Desporto para a Deficiência Visual, assinalado no passado sábado, 24 de abril, o Centro Reabilitação de Nossa Senhora dos Anjos (CRNSA) organizou uma demonstração de modalidades desportivas adaptadas (goalball, futebol de 5, bowling de nove pinos e atletismo), no ginásio e exterior do centro.

O Centro de Reabilitação Nossa Senhora dos Anjos é um estabelecimento da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, que tem como missão promover a reabilitação de pessoas com cegueira adquirida ou baixa visão, visando a sua autonomia e inclusão. Aqui, o desporto tem um papel fundamental na superação das adversidades e em dar visibilidade às capacidades de cada um.

Eunice Santos: “O desporto é a minha vida”

No grupo de utentes que participaram nesta demonstração de modalidades, encontrámos Eunice da Silva Santos, 44 anos, licenciada em Comunicação Social. Foi atleta de alta competição no desporto adaptado, entre 1997 e 2004, altura em que teve de abandonar, depois de sucessivas operações aos olhos.

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Eunice sempre teve baixa visão. Há dois anos perdeu a capacidade visual que lhe restava. Hoje, vê apenas claridade. Até 2019, via apenas dez por cento. Mas que faziam toda a diferença na sua vida. Tinha alguma autonomia. Corria na rua. Fazia as suas tarefas. Ainda assim, a paixão pelo atletismo é a mesma. “O desporto é a minha vida”, afirma, com um sorriso. “É muito importante assinalar este dia. É preciso sensibilizar a população para a prática desportiva e para os seus benefícios”, defende.

“Infelizmente, as pessoas só se apercebem das nossas capacidades de quatro em quatro anos, por aquilo que conseguimos nos Jogos Paralímpicos e nos Campeonatos da Europa e do Mundo, lembra. “Ainda existe um certo preconceito para com os deficientes visuais. É um mundo visual. A maioria dos estímulos são visuais. Logo, as pessoas pensam que perder a visão é o fim do mundo”, admite.

Eunice diz que não pode estar parada. Por isso continua a fazer desporto, o que lhe permite fazer amigos, superar-se e acreditar, cada vez mais, nas suas capacidades. “O desporto é a minha terapia”, conclui.

João Panzo João: “Quando estou a fazer desporto, esqueço-me que não vejo. É uma alegria total”

João Panzo João, 45 anos, dedicou décadas ao basquetebol profissional. Primeiro em Angola, depois, a partir de 1999, em Portugal. “Foram tempos bons”, lembra. Em 2016, a vida do angolano transformou-se. Perdeu 95% da visão.

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Mas João não baixou os braços. Foi à luta. Com a ajuda do CRNSA encontrou um caminho. “A minha vida transformou-se por completo. Agora já estou mais conformado. Mas não foi nada fácil. Nesta casa, onde estamos, é que eu reaprendi tudo ou quase tudo. Foi uma ajuda muito importante. Ninguém imagina as longas horas de conversas, o apoio psicológico e a aprendizagem. É um processo que leva o seu tempo”, explica.

“O desporto é muita coisa na vida das pessoas, sobretudo nas pessoas que têm baixa visão ou cegueira. Além de uma melhor condição física, a prática desportiva dá-nos esperança, motivação e amigos. Portanto, é muito mais do que desporto o que estamos a fazer aqui”, assegura. “Quando estou a fazer desporto, esqueço-me que não vejo. É uma alegria total”, remata.

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Isabel Pargana: “não há impossíveis” para as pessoas com deficiência visual

Para Isabel Pargana, 48 anos, diretora do CRNSA, “não há impossíveis” para as pessoas com deficiência visual. “Estamos a promover hábitos de vida saudáveis, inclusão e uma forma das pessoas redescobrirem as suas capacidades e limites”.

O Centro de Reabilitação Nossa Senhora dos Anjos, pelo trabalho que desenvolve, não podia deixar de associar-se à celebração do primeiro Dia Mundial do Desporto para a Deficiência Visual, sublinha Isabel Pargana. “Por outro lado, e considerando o contexto pandémico que estamos a viver, achámos que era uma oportunidade única de proporcionar convívio, interação, uma dimensão lúdica e, ao mesmo tempo, aprofundar alguns conhecimentos das modalidades que fazem parte dos desportos para pessoas com deficiência visual”.

O Centro de Reabilitação Nossa Senhora dos Anjos

Com mais de 50 anos de história, constitui-se como a principal referência a nível nacional, recebendo pessoas oriundas de todo o país, ilhas e PALOP.

Além de um Programa de Reabilitação, que inclui áreas como a informática, a orientação e mobilidade, a atividade motora, as atividades de vida diária, o braille, entre outras, indo ao encontro das necessidades de cada pessoa, o centro desenvolve também o Programa de Estimulação Sensorial na 1.ª Infância, para crianças dos 0 aos 6 anos de idade, que procura minimizar os efeitos da cegueira ou baixa visão no desenvolvimento global da criança.

 

Diversas especialidades médicas e cirúrgicas

Programas de saúde e cuidados de saúde ao domicílio

Unidades da rede nacional

Prestação de apoio psicológico e psicoterapêutico

Aluguer de frações habitacionais, não habitacionais e para jovens

Bens entregues à instituição direcionados para as boas causas

Programação e atividades Cultura Santa Casa

Incubação, mentoria e open calls

Anúncios de emprego da Santa Casa

Empregabilidade ao serviço das pessoas com deficiência

Jogos sociais do Estado e bolsas de educação

Ensino superior e formação profissional

Projetos de empreendedorismo e inovação social

Recuperação de património social e histórico das Misericórdias

Investimento na investigação nas áreas das biociências

Prémios nas áreas da ação social e saúde

Polo de inovação social na área da economia social

Voluntariado nas áreas da ação social, saúde e cultura

Ambiente, bem-estar interno e comunidade

Ofertas de emprego

Contactos gerais e moradas